06 julho 2006

O Amor é uma coisa que se aprende

Comentários sobre o Amor duma perspectiva psicológica sempre me atraíram. Ainda que quando amamos toda explicação seja pragmática, algumas coisas são bem bacanas e verdadeiras. A palestra O Amor é uma coisa que se aprende proferida por Contardo Calligaris no programa Café Filosófico da TV Cultura, ainda que vaga, foi boa.

O Problema Clássico
Logo de começo esbarra num problema clássico: a dificuldade em encontrar traços comuns entre as mulheres que amou. Não há um modelo estético padrão, um tipo específico de gosto ou postura nelas. Só há semelhança na narrativa desses amores: foram amores difíceis ou impossíveis. "O ponto forte do amor é a dificuldade do encontro, a aflição da saudade", ele afirma. Só que as dificuldades que ele expõe são sumariamente classe-média-alta-de-direita: "nos encontramos em Londres e ela ia voltar pro Canadá dali alguns meses", blábláblá. Não concordo tanto, mas sigamos adiante.

O Amor Dentro de um Repertório Cultural e Determinismos Bioquímicos
Aprendemos a amar com o Cinema e a Literatura, o que torna o amor fruto do "repertório cultural" em que vivemos. Ele não citou, mas me pergunto: índio anda de mãos dadas? Beija? Não bastasse isso, há o fator bioquímico em torno do amor: uma substância chamada feniletilamina. Aqui ele afirma que por esses fatores bioquímicos o amor pode durar de 3 meses a 6 anos. Pesquisando na internet, achei uma matéria que cita outras duas substâncias: dopamina e ocitocina; nessa matéria, a psicóloga Cindy Hazan, afirma: "seres humanos são biologicamente programados para se sentirem apaixonados durante 18 a 30 meses".

As (r)evoluções do Amor
Fugindo dessas divagações científicas, o amor como fator de (r)evolução é algo que não poderia faltar. Por volta do século XII existia o que se chama de "amor cortês", atrapalhado por fatores sociais, vide o clássico Romeu e Julieta. Num certo momento da história, há o triunfo do indivíduo sobre a sociedade, e é aqui que começa a revolução. Narrado pela Literatura em geral e cantado pela poesia, o amor sofre uma revolução de costumes, onde não há mais a barreiras cínicas de interesses escusos. Mas continua sendo difícil, mesmo na modernidade. Por quê?
Como já citado antes, o amor é fruto do repertório cultural; esse repertório celebra o indivíduo, não o casal. As histórias de amor mais atraentes são sempre de amores difíceis. Poderíamos comprimir a história de Romeu e Julieta ao primeiro ato, e narrar a vida deles como casal, mas seria um saco! Depois do "foram felizes para sempre", as narrativas, quando feitas, são do tipo comédia.

Amor e Psicologia
Para a psicologia, amar é "idealizar o outro", daí, o objetivo do amor é ser amado por uma coisa idealizada. Esse amor ideal precisa de uma distância para acontecer, pois é mais fácil preservar essa idealização quando o outro está distante. Então ele diz algo que eu já havia dito antes pra minha namorada: "amar é não poder estar sem o outro, o que é bem diferente de estar com o outro". Eu concordo, mas não acho que a presença do outro pode apagar essa idealização. Lembrando um pouco de Schopenhauer, é muito fácil a gente querer coisas diferentes, pessoas diferentes, mas esquecemos de pensar o que seria de nossas vidas se não tivéssemos o que temos. Se imaginar ao lado de outra pessoa é fácil, mas a questão é: o que seria de minha vida sem a pessoa que está comigo agora, a quem eu amo tanto? Eu, Fabricio, ficaria perdido, como era algum tempo atrás.

A Renúncia Amorosa
Calligaris cita dois filmes: "Os brutos também amam" e "Casablanca". Em ambos há uma questão interessante: a renúncia amorosa; abrir mão do amor para o bem da pessoa amada. No Casablanca, único dos dois que vi, o cara reencontra uma mulher que amou há muito tempo, e ela está casada com outro. Ele tem a chance de salva-la (algo com nazistas e a II GM), e a deixa ir embora com o outro, ainda que os dois emboçassem um pouco amor.
Qual a grande personagem da história que chega a arrancar os próprios olhos por causa de uma mulher? Édipo!
Os psicólogos e o velho Édipo...

O programa é encerrado com a seguinte frase, dita pela apresentadora: aprender a amar não é uma possibilidade, é uma conquista.


Considerações
Muito por ineficiência minha e um pouco pelo próprio palestrante e editores do programa, as idéias não estão bem intercaladas.
É interessante ouvir essas palestras e tentar entender um pouco de algo tão confuso. Mas é quase impossível realmente definir o que é amor ou uma relação amorosa. Durante muito tempo achei que a frase do Lacan “amar é dar o que não se tem a quem não o quer” era a melhor definição de amor. Hoje não acho. Vivo um amor intenso, dado a divagações em torno do próprio umbigo, mas não me sinto encaixado dentro de algumas definições dessa palestra.
Se tenho medo de que a feniletilamina acabe daqui alguns anos? Não. O amor é muito mais.
Talvez ele possa perder o ritmo um dia. Talvez possa até acabar. Vai saber?
Mas tudo isso são possibilidades, assim como também é o fato de podermos ser atropelados, assassinados, roubados. O pessimismo que gira em torno do amor moderno é, também, coisa do nosso ‘repertório cultural’ cuja pauta é o consumo. Tudo em nossa sociedade gira em torno de idéias de consumo, e acabamos crendo, quase que inconscientemente, que o amor pode ser consumido, pode ser desgastado como uma roupa que cobiçamos durante meses numa vitrine, compramos e usamos.
Felizmente, o amor é um pouco mais que feniletilamina, dopamina e ocitocina. Um pouco mais que Freud e Lacan.

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