29 julho 2006

Pobrezas

para Felipe,


"- Você acha que ele fez tudo isso para ser convidado a cozinhar para nós? Para nos envenenar?
- E deu certo.
- Porque ele está nos envenenando?
- Você não esta fazendo a pergunta certa.
- E qual é a pergunta certa?
- Porque nós estamos nos deixando envenenar?"
L.F. Veríssimo


Muita coisa é perdoável nesse mundo. Há pessoas verdadeiramente mesquinhas, que escondem no bolso balas que só serão descobertas depois de passarem pela lavanderia. Mas aí não há tempo nem de chupa-las, nem de dá-las para alguém. Estragaram. É algo ruim, mas não nos prejudica tanto. Se você pedir, é até capaz de ela dar, mesmo que contra a vontade.
Há pessoas insensíveis. Pessoas que só percebem quando estamos mal se gritarmos. Mas a sensibilidade é para poucos, e a presença de alguém, ainda que insensível, nos alivia. Porque as pessoas insensíveis não são de todo más.
Há pessoas cegas. Que não enxergam a beleza que há em nós, que nossa intenção às vezes é ajudar. Estendemos tapetes de rosas na frente dela, que não enxerga. Chega a tropeçar, mas não enxerga.
Mas a pobreza de espírito, a pequenez de alma, a quase ignorância com os sentimentos alheios... não dá pra aceitar. Porque às vezes é difícil amar uma pessoa só porque ela nos ama.
Mesmo um esboço de alma sabe respeitar o amor alheio. Não adianta dar a mão na calçada, e depois dizer: "atravesse a rua sozinho". Pode até falar, mas não deve dar as mãos. Ao menos deixe claro: eu não vou atravessar a rua com você.
Pois ainda que ficasse muito tempo de sua vida do lado de lá da rua, um dia você ia entender que é preciso atravessar. Mas de que valem mãos dadas na calçada? E se a pessoa gritasse: “atravessa sozinho, porra!”, seria melhor.
Perdesse a ternura, endurecesse, fizesse o diabo...
E à simples pergunta “por quê?”, a pessoa responderia: compaixão, piedade, comiseração. Ao que você choraria, posto que é parte da história. Daqui eu daria gargalhadas, confesso. Piedade?
Huahuahuahuhauhauahuahuahuahauhauahuahauhauhauahuahuuahauhua
Não, não, não...
Desculpe, caro amigo. Há pobrezas irremediáveis, que fazem sentimentos belíssimos não valerem a pena.
E aos gatos que te arranham por dentro, recomendo o que Vinicius de Moraes chamava de cachorro engarrafado; o melhor amigo do homem: whisky. Não que se embebedar, se mutilar, valha a pena. Mas é infinitamente melhor beber pela inevitabilidade da vida que por... bom, como chamamos isso?

De Mãos Dadas

para Sheila,

É como se andássemos de mãos dadas ao som de uma música que só nós ouvimos. Abraçados num bar, tocam Vinicius pra gente.
E não fomos tão longe para ter felicidade. Não há nada verdadeiramente novo ao alcance de nossas mãos, exceto o fato de vez ou outra estarem elas entrelaçadas, ao andarmos, ao pararmos, ao nos beijarmos.
Estamos onde sempre estivemos, temos o que sempre tivemos, somos o que fomos.
Mas as nossas mãos se dão como se ao se tocarem - ao nos tocarem - obedecessem ao coração; da mesma forma como a fome faz levar alimento à boca, nossa sede de si pega com as mãos algo de nós que é a própria felicidade, ou é o alimento que ela precisava pra viver em nós.
E o espanto é muito por sermos pouco e sermos tanto!
E não precisamos de dias ensolarados ou noites enluaradas pra sentirmos isso. Chove lá fora, possivelmente a mesma chuva que chovia quando eu era sozinho, mas hoje eu andaria com você na chuva e acharia lindo! E olha só: a mesma chuva que antes me deixava triste!!!
O que antes já era bom – como tomar chopp e ouvir MPB no Bar do Tinóia – se torna ainda melhor com você. Coisas que antes não faziam sentido, hoje são necessárias. Você ilumina, espalha um cheiro, uma leveza, uma beleza de coisa simples que faz de ti a coisa mais necessária e importante da minha vida.
EU TE AMO

18 julho 2006

Minha Vida

Minha vida é busca da felicidade, admitindo, desde já, que a busca de algo é sinal da ausência do mesmo.
(Ainda que sejam mesquinhos os milionários. Será isso?)
É busca, mas também é espera.
Espera de felicidade, ou pausa para ser feliz???
Minha vida é deslumbre enlouquecido pelas coisas que amo.
Minha vida é quem eu amo, e eu amo sempre, muito e mais, mesmo em momentos difíceis.
Tanto quanto a minha é a vida dela. Porque eu já nem posso imaginar como seria sem ela, a parte de mim que atende pelo nome Sheila. Porque esses desvãos do ser, os desassossegos todos, as angústias, as grandes questões existenciais, as vontades de potência, os complexos, as dores do mundo, as injustiças, as filosofias, as poesias, as falácias... nada faz sentido.
Porque antes eu não tinha vida, eu existia. E viver também é sentir dor, é ter dúvida, é ter medo, e AMAR.
E muito disso sempre aconteceu com intensidade em mim, inclusive/sobretudo as dores. Mas o amor sempre me foi desconhecido. E por só agora conhecer o Amor, eu não posso perder essa minha vida. Porque eu não conseguiria enfrentar o mundo sem amor, sem essa minha vida de nome Sheila.
E essa espécie de dependência dói.
"Todos nós necessitamos sofrer certo número de preocupações, de penas e misérias, da mesma maneira que um barco tem necessidade de lastro para conservar seu equilíbrio. " Schopenhauer.

Tenho muito amor e essa dor típica dos que se pensam ou se querem filósofos.
Me dê a mão, Sheila.

A vida e sua tristeza

O triste da vida é que só os cínicos parecem entendê-la.
E tudo que é belo parece ser mentira, e são poetas todos que acreditam em algo bom, mesmo os poetas sujos.
O triste da vida é o medo que ela impõe pra ser vivida intensamente. Pois de repente podemos ser podados, sem mais, sem menos, sem...
E tudo que é bom pode acabar, sumir, perder a graça, ser roubado.

Tempo da Delicadeza II

O mundo não é delicado. A delicadeza se dá num tempo, num intervalo. Tempo da delicadeza.
E esse tempo nunca é ganho. Não é uma prorrogação. Não é um acréscimo.
É compensação. É reposição de faltas cometidas. Não é hora extra.
O pôr do sol é delicado, o crepúsculo ocorre num tempo delicado. Mas o calor do sol durante o resto do dia é indelicado.
Eterno tempo da delicadeza é querer um crepúsculo para sempre.

Quem sou eu?

Há uma dificuldade muito grande em se definir. Dá a impressão de que a questão se divide entre 'se encontrar' ou 'se escolher'. Criar? "Eu sou um outro", disse Rimbaud.
Conheço muito bem minhas paixões, meus amores, mas desconheço suas origens. Eu realmente escolhi? Era pré-determinado e eu só encontrei?
"O que pensar da vida e daqueles que sabemos que amamos?", perguntou-se Renato Russo.
É difícil definir-se à luz dessas informações. Numa escala percentual, diria que conheço 50% de mim mesmo. Outros 10% são de domínio alheio, não dependem de mim; são meus gestos, reflexos dos quais quase sempre não tenho consciência.
Outra parte é fruto do meio e dos gostos. Sou muito de Fernando Pessoa, Chico Buarque, Wilde, Vinicius de Moraes etc. Quem lê muito acaba se misturando com os autores, da mesma forma como as pessoas 'normais' absorvem informações dos amigos e parentes. Embora frio, é justo dizer que quando gostamos muito de um escritor ele se torna nosso amigo.
Outra grande parte é descoberta quando amamos alguém. Quem não ama muito e exageradamente não descobre um pedaço de si mesmo. E essa parte acaba definindo tudo o mais; você quer mudar, ver as coisas de outra forma, crescer e ser feliz. E cada dia que passa isso vai aumentando, adquirindo mais valor.
Mas essa parte descoberta pelo amor embaralha as outras partes. Além de fundir o pouco de si que conhecemos com a pessoa que amamos. E de acrescentar ao curriculum de dores que sentíamos, as dores dela.
Porque ela é tanto quanto a minha vida. Tanto quanto eu.

Suspiro

do lat. suspíro,as,ávi,átum,áre 'respirar com força, estar ofegante; suspirar, gemer; ter saudades de; exalar'; ver -spir(o)-; f.hist. sXIII sospirando, sXIV suspirar, sXIV ssospirar

substantivo masculino

1 inspiração mais ou menos profunda e prolongada, seguida de expiração audível, motivada por um incômodo físico ou psíquico, como fadiga, desgosto, tristeza etc., ou tb. em razão de alívio, satisfação, desejo etc.

2 aspiração; movimento aspiratório

3 Derivação: sentido figurado.
som que expressa tristeza; gemido, lamento, queixume

4 (1630) Derivação: sentido figurado.
intenso anseio por um bem (espiritual ou material); desejo, ânsia
Ex.: quem atenderá aos seus s.?

5 saudade de alguém ou alguma coisa
Ex.: vive cheia de suspiros pelo filho amado

6 Derivação: sentido figurado.
expressão de paixão amorosa e dos tormentos e aflições que ela provoca
Ex.: até quando ficará surda aos meus s. e ais?

7 (1881) Derivação: sentido figurado.
som doce, melancólico, suave; murmúrio, sussurro
Ex.: o s. do vento na folhagem


Nem o Houaiss consegue explicar porque nalguns momentos suspiramos.
Se algo dói, a gente grita ou chora. Se incomoda, resmungamos. Suspiramos em função dum incômodo que tanto pode ser bom quanto mau.

Posse

"Tudo no futebol é complicado pela presença de um time adversário"
Sartre


Grande parte dos sentimentos consegue ser unipolar. Muitos amam sem ser amados, odeiam sem ser odiados, admiram sem ser admirados. A posse não. Quando há o sentimento de posse sobre algo / alguém, é recíproca. Pelo menos uma pequena consciência dela o é.

Porque se há a idéia de posse, ainda que distante, confusa, é porque ela já foi próxima no passado. Ela foi concreta. Daí que quando manifestada a vontade de reaver a posse de algo abandonado, tudo vem à tona. Porque os escravos precisam ser chicoteados tanto quanto os algozes precisam chicotear.

E a consciência da posse, ou a vontade dela, se dá ao vislumbrar a perda. Como a criança que deixa de lado a bola, e só quer voltar a jogar quando outra criança a pega. E começa a briga.

Porque posse de bola é diferente do placar do jogo.

45 min. do segundo tempo. Pênalti.

12 julho 2006

Os Alckmistas Estão Chegando?

Desculpem-me os simpatizantes, mas quem é Geraldo Alckmin?
Ainda que à sombra de Mario Covas (era mediano quando vivo, mas ficou melhor depois que morreu), nunca teve expressão política. Usar do crescimento do estado de São Paulo para fazer campanha, até Maluf faz. São Paulo cresce e aparece por si só, é inevitável.
Mas a minha mágoa talvez seja fruto do péssimo desempenho da educação no período Covas/Alckmin. Creio que em 1996, quando cursava a 6º série, passei por um longo período de greve. Na época achei maravilhoso, afinal tudo que eu queria era jogar bola, empinar pipa etc. Ou seja: praticamente não tive 6º série, pois a reposição foi uma farsa.
E a "escolinha de verão", alguém lembra? Confesso que fui um dos privilegiados; não fosse isso, seria reprovado na 8º série. Mas é certo? Tudo bem que eu ainda consegui engatar quando entrei no Ensino Médio, aprendi a ler, escrever, e fiz até curso técnico numa escola federal, mas a grande maioria chegava no EM quase analfabeta, e não conseguia recuperar.
Deixando os traumas de lado, a prova cabal da péssima índole do Alckmin foi deixar Cláudio Lembo, seu substituto no governo de São Paulo, na mão quando o bicho pegou por causa do PCC. Simplesmente fingiu que não era com ele...
Não bastasse, essa semana, enquanto os outros candidatos fazem campanha pelo Brasil, ele viaja para a Europa. Argh!
Das ligações com o Opus Dei nem comento. Não sei bem do que se trata, mas me causa arrepios.

Os eleitores de Alckmin são classe média pra cima, ou classe baixa querendo ascender. Um deles, grande amigo meu, afirmou: "as pessoas esclarecidas votarão no Alckmin".
Esclarecidas pela Globo e pela Veja, sem dúvida.

É... uma eleição difícil essa. Lula foi decepcionante da primeira vez, possivelmente será na segunda. Talvez não. Por revolta e por crer no socialismo, como utopia ou não, gosto da Heloisa Helena. Tenho consciência de que ela não fará milagres, não acabará com a desigualdade, não implantará um 'socialismo democrático' no Brasil. Mas na minha opinião é a melhor candidata. Penso cá com meus botões (os do teclado): afinal, o que nos faz escolher um candidato? Política é um troço complicado. Talvez por isso eu vá fazer Ciências Sociais, ainda na dúvida se com especialização em Sociologia ou Ciência Política.

Mas digo logo: segundo turno com Alckmin e Lula, voto no Lula.

Da Série "O Amor é Inventivo"

O amor é inventivo e anula os postulados da lógica.
Ele tem sua lógica própria, tão válida quanto a outra.
E os amantes se entendem sob o signo do absurdo...
Drummond


- É que eu amo tanto, mas TANTO, que acabo acreditando que nem Vinicius de Moraes amou assim.
Ela ri, me olha com olhar apaixonado e me beija de forma mais apaixonada ainda. Recupero o fôlego, e continuo:
- Embora ele escreva um pouco melhor que eu. Mas só um pouquinho...
- Ah! Como meu namorado é modesto, rsrsrsrrs
E ganho outro beijo apaixonado.

06 julho 2006

Confesso que vivi

A grande vantagem dos exagerados é que eles vivem sempre um pouco mais que a grande maioria. E esse "mais" não é medido por unidade de tempo, espaço percorrido, nada. É a unidade desconhecida com a qual se mede o prazer.
Minha infância foi deslumbrante, com direito a pescarias, cabanas, tombos fenomenais, fogueiras enormes, braço quebrado, pedradas, campeonatos, invasão de quintais para resgatar bolas ou roubar frutas, piqueniques, atropelamentos, espionagem em banheiros femininos, pontos na cabeça, microempresas de lavagem de carro, banho em cachorro...
Na escola, tive grandes amigos (mais amigas, na verdade), bolei aulas, colei provas, fiz escolinha de verão, recuperação, toquei Legião Urbana em rodas de pessoas desafinadas, fui expulso da sala, colei cartazes revoltados na parede do pátio, colei fotos de mulheres peladas no banheiro da 5º série, organizei festinhas, passeios, discuti com professores, cheirei giz, participei de guerras de giz e papel...
Passei dias lendo deitado e descobrindo o mundo maravilhoso da Arte. Com pouquíssimo conhecimento de causa, queria discutir Nietzsche aos 15 anos (nem tinha lido ainda!), lia poesia de forma desesperada, descobri Fernando Pessoa e fiz dele meu amigo.
Adolescente, mergulhei de cabeça no desvario roubado de baladas inabaláveis, fiquei horas inconsciente, acordei sem saber como cheguei em casa, vomitei sangue, beijei mulheres maravilhosas e estranhas, trabalhei bêbado, gastei fortunas com whisky, corri de cueca em Moema, me equilibrei, bêbado, na mureta da Av. Washington Luiz, voltei pra casa andando em madrugadas frias, fumei maconha e ri horas sem parar, tive alucinações, experimentei drogas mais ilícitas que maconha, perdi a chave de casa e dormi na rua...
Confesso que já chorei sozinho. Achei o mundo algo horrível e quis morrer. Levantei sem vontade de acordar, achei que nunca seria feliz, trabalhei sem vontade de trabalhar, queria fugir... As lágrimas são lembradas sem saudades, mas como algo necessário.
Hoje, pela primeira vez estou amando alguém de verdade. E aqui cabem as duas interpretações: tanto o amor quanto ela são de verdade.
Neruda escreveu "Confesso que Vivi" já um pouco velho, com muito mais experiência que eu, que também confesso que vivi e estou vivendo. Mas só enxergo essas coisas porque estou amando.
Se um dia posso chorar novamente, achar tudo horrível, pensar em não ser feliz? Sim, é possível. Mas hoje não... Confesso que vivi, e confesso que quero viver ao seu lado, Sheila.

O Amor é uma coisa que se aprende

Comentários sobre o Amor duma perspectiva psicológica sempre me atraíram. Ainda que quando amamos toda explicação seja pragmática, algumas coisas são bem bacanas e verdadeiras. A palestra O Amor é uma coisa que se aprende proferida por Contardo Calligaris no programa Café Filosófico da TV Cultura, ainda que vaga, foi boa.

O Problema Clássico
Logo de começo esbarra num problema clássico: a dificuldade em encontrar traços comuns entre as mulheres que amou. Não há um modelo estético padrão, um tipo específico de gosto ou postura nelas. Só há semelhança na narrativa desses amores: foram amores difíceis ou impossíveis. "O ponto forte do amor é a dificuldade do encontro, a aflição da saudade", ele afirma. Só que as dificuldades que ele expõe são sumariamente classe-média-alta-de-direita: "nos encontramos em Londres e ela ia voltar pro Canadá dali alguns meses", blábláblá. Não concordo tanto, mas sigamos adiante.

O Amor Dentro de um Repertório Cultural e Determinismos Bioquímicos
Aprendemos a amar com o Cinema e a Literatura, o que torna o amor fruto do "repertório cultural" em que vivemos. Ele não citou, mas me pergunto: índio anda de mãos dadas? Beija? Não bastasse isso, há o fator bioquímico em torno do amor: uma substância chamada feniletilamina. Aqui ele afirma que por esses fatores bioquímicos o amor pode durar de 3 meses a 6 anos. Pesquisando na internet, achei uma matéria que cita outras duas substâncias: dopamina e ocitocina; nessa matéria, a psicóloga Cindy Hazan, afirma: "seres humanos são biologicamente programados para se sentirem apaixonados durante 18 a 30 meses".

As (r)evoluções do Amor
Fugindo dessas divagações científicas, o amor como fator de (r)evolução é algo que não poderia faltar. Por volta do século XII existia o que se chama de "amor cortês", atrapalhado por fatores sociais, vide o clássico Romeu e Julieta. Num certo momento da história, há o triunfo do indivíduo sobre a sociedade, e é aqui que começa a revolução. Narrado pela Literatura em geral e cantado pela poesia, o amor sofre uma revolução de costumes, onde não há mais a barreiras cínicas de interesses escusos. Mas continua sendo difícil, mesmo na modernidade. Por quê?
Como já citado antes, o amor é fruto do repertório cultural; esse repertório celebra o indivíduo, não o casal. As histórias de amor mais atraentes são sempre de amores difíceis. Poderíamos comprimir a história de Romeu e Julieta ao primeiro ato, e narrar a vida deles como casal, mas seria um saco! Depois do "foram felizes para sempre", as narrativas, quando feitas, são do tipo comédia.

Amor e Psicologia
Para a psicologia, amar é "idealizar o outro", daí, o objetivo do amor é ser amado por uma coisa idealizada. Esse amor ideal precisa de uma distância para acontecer, pois é mais fácil preservar essa idealização quando o outro está distante. Então ele diz algo que eu já havia dito antes pra minha namorada: "amar é não poder estar sem o outro, o que é bem diferente de estar com o outro". Eu concordo, mas não acho que a presença do outro pode apagar essa idealização. Lembrando um pouco de Schopenhauer, é muito fácil a gente querer coisas diferentes, pessoas diferentes, mas esquecemos de pensar o que seria de nossas vidas se não tivéssemos o que temos. Se imaginar ao lado de outra pessoa é fácil, mas a questão é: o que seria de minha vida sem a pessoa que está comigo agora, a quem eu amo tanto? Eu, Fabricio, ficaria perdido, como era algum tempo atrás.

A Renúncia Amorosa
Calligaris cita dois filmes: "Os brutos também amam" e "Casablanca". Em ambos há uma questão interessante: a renúncia amorosa; abrir mão do amor para o bem da pessoa amada. No Casablanca, único dos dois que vi, o cara reencontra uma mulher que amou há muito tempo, e ela está casada com outro. Ele tem a chance de salva-la (algo com nazistas e a II GM), e a deixa ir embora com o outro, ainda que os dois emboçassem um pouco amor.
Qual a grande personagem da história que chega a arrancar os próprios olhos por causa de uma mulher? Édipo!
Os psicólogos e o velho Édipo...

O programa é encerrado com a seguinte frase, dita pela apresentadora: aprender a amar não é uma possibilidade, é uma conquista.


Considerações
Muito por ineficiência minha e um pouco pelo próprio palestrante e editores do programa, as idéias não estão bem intercaladas.
É interessante ouvir essas palestras e tentar entender um pouco de algo tão confuso. Mas é quase impossível realmente definir o que é amor ou uma relação amorosa. Durante muito tempo achei que a frase do Lacan “amar é dar o que não se tem a quem não o quer” era a melhor definição de amor. Hoje não acho. Vivo um amor intenso, dado a divagações em torno do próprio umbigo, mas não me sinto encaixado dentro de algumas definições dessa palestra.
Se tenho medo de que a feniletilamina acabe daqui alguns anos? Não. O amor é muito mais.
Talvez ele possa perder o ritmo um dia. Talvez possa até acabar. Vai saber?
Mas tudo isso são possibilidades, assim como também é o fato de podermos ser atropelados, assassinados, roubados. O pessimismo que gira em torno do amor moderno é, também, coisa do nosso ‘repertório cultural’ cuja pauta é o consumo. Tudo em nossa sociedade gira em torno de idéias de consumo, e acabamos crendo, quase que inconscientemente, que o amor pode ser consumido, pode ser desgastado como uma roupa que cobiçamos durante meses numa vitrine, compramos e usamos.
Felizmente, o amor é um pouco mais que feniletilamina, dopamina e ocitocina. Um pouco mais que Freud e Lacan.

05 julho 2006

Pequena consideração sobre a TV

A gente sempre fala que a TV aberta é uma merda, que só tem sacanagem, desgraça e mentiras. Mas confesso: vez ou outra me flagro assistindo essas porcarias. Veríssimo justificou dizendo que existe a preguiça e a inércia; a primeira faz com que sentemos na frente da TV com o controle na mão mudando de canal sem assistir coisa alguma do começo ao fim; já a segunda nos deixa plantados assistindo uma besteira qualquer, que julgamos horrível.
Sou mais preguiçoso que inerte, mas quando se trata de sacanagem e mulheres seminuas, sou inerte. Mas onde eu estava mesmo? Ah, sim! Era domingo a noite...
Sempre preferi o programa Entrelinhas e o Café Filosófico ao Fantástico. O Entrelinhas sumiu da programação da Cultura, o que fez com que eu ficasse plantado diante do Bial divagando sobre a derrota na copa. Num intervalo mudei de canal e vi que o Café Filosófico se manteve, e o tema era bem atraente: "O Amor é uma Coisa que Se Aprende", proferida por Contardo Calligaris. Lógico que ia assistir.
Mas creio que devo começar noutro texto, já que esse aqui ficou relativamente grande e sem graça.

04 julho 2006

Futebol

Assim que Baggio perdeu o pênalti em 94, eu saí pela rua correndo, tocando corneta e gritando "é tetraaaaaaaa" de tal forma que quando parei, mal conseguia respirar, tão pouco falar. Minha mãe chegou a ficar preocupada.
A empolgação se manteve por anos, posto que meu Palmeiras era time de estrelas e vitórias sem fim. Lia o Lance quase todos os dias, colecionava figurinhas e cheguei até a esboçar o sonho de ser goleiro. Como toda empolgação infanto-adolescente, diminuiu com o tempo até quase acabar. Chegamos, então, em 1998.
Antes de a copa começar eu já tinha álbuns, revistas, recortava jornais, comprei bandeiras, adesivos... tudo que tinha direito. Quando anunciaram que Romário não ia participar, quase chorei. Mas assisti todos os jogos com empolgação. Inclusive a final.
A gente não gosta de perder, mas aos 14 anos eu já havia sentido esse gosto amargo antes. Perder a copa na final não me frustrou tanto, já que se tratava de esporte, blábláblá, aquela conversa que ouvimos desde os 4 anos. O grande desconforto veio com a idéia de que o jogo foi "comprado". Creio que foi meu primeiro encontro com a desonestidade e afins. Definitivamente eu havia desencantado.
A Copa de 2002 me foi indiferente. Mal lembro da final, muito menos dos jogos. Em resumo, "que se foda", pensava.
Na de agora, por ter estudado um pouco de Relações Internacionais, acompanhei de longe o fato de o Irã estar participando e a possibilidade de seu 'presidente' ir a Alemanha; vi com deslumbre a presença de países africanos numa copa na Alemanha, dentre outras coisas interessantes.
Torci, de coração mesmo, pra Gana em todos os jogos, inclusive contra o time que chamam de "Brasil". Achava um futebol criativo, com algumas limitações técnicas, mas que dava gosto de ver e tinha uma denotação política pra mim.
Mas voltando a tal “seleção brasileira”, impossível não manifestar a revolta de perder daquele jeito. Um futebol de merda, claramente posto em campo por interesses financeiros. Manter aquele gordo em campo? Roberto Carlos, Cafu... todos estrelas de diversas propagandas, não mais do Futebol. Ronaldinho Gaúcho jogando amarrado...

Um absurdo. Onde vamos parar? Se eles têm coragem de fazer algo assim com a dita “paixão nacional”, o que mais poderão fazer? Do que são capazes?
Continuo me surpreendendo com o Big Brother que coordena as grandes corporações, os interesses escusos de pessoas mesquinhas.
Acaba sendo somente mais uma forma de injustiça. A vantagem é que meche com paixão, o que deveria causar revolta. Alguns urubus disfarçados de tucanos vêem a hipótese disso atrapalhar a campanha do Lula, já atrapalhada por si só.
(suspiros)
Aos poucos foram tirando o pão, agora desmontam o circo.