17 abril 2006

O Amor na Era da Sobrecarga

Não foi pouca minha empolgação quando vi o tema do Café Filosófico de ontem: "O Amor na Era da Sobrecarga", por Ivan Capelatto.

Capelatto faz uma explanação geral do amor, começando na dita “fase oral” da criança, que se dá entre os 5 e 6 anos de idade. Como todo mundo já deve ter testemunhado, as crianças dessa idade são extremamente chantagistas, merecendo de Freud a alcunha de "pequenos monstros poliformes". Predomina nesse amor, dito narcísico, o interesse de autopreservação.

Na fase seguinte, chamada fase fálica, ocorre a diminuição do amor narcísico e o aumento do amor pelo outro. Essa diminuição se dá pela aquisição da capacidade de simbolização das crianças, onde a mãe passa a ser sinônimo de segurança. Capelatto cita a idéia - não sei se freudiana - de "amor pertinência"; pertinência, pela definição do dicionário, é "aquilo que concerne ao assunto". Creio eu que o assunto aqui é preservação e segurança.

Por volta dos 6 anos se dá o amor pelos iguais - homo. Nessa fase, chamada de "latência", a criança começa a amar o que há de igual a si no outro, daí aquelas amizades inseparáveis, onde duas meninas precisam até mesmo ter o corte de cabelo parecido. Na adolescência ocorre a superação dessa fase, onde, teoricamente, aprendemos a amar as diferenças que há no outro. Porém, nem sempre isso ocorre, dando origem ao amor homossexual. Interessante notar que o amor homo não ocorre obrigatoriamente entre pessoas do mesmo sexo. Há amor homo entre homens e mulheres, assim como há amor hetero (amor pelas diferenças) entre dois homens ou duas mulheres.

Fecha a primeira parte da palestra citando a maturidade como sendo um amor cuidador; inicia a seguir uma explanação sobre neurose, psicose e psicopatia.

Neurose, aplicada ao amor, se resume ao medo de perder a pessoa amada. Capelatto diz que a afetividade neurótica é a mais perfeita, pois ao mesmo tempo em que temos consciência de si, mantemos a preocupação com o outro. Exemplo ótimo que ele dá na palestra: o cara tá lá, tomando cerveja, e a mulher diz "amor, é melhor você parar de beber". Ele, de certa forma irritado, começa a beber mais como numa espécie de provocação. Quando ela não está ali, enchendo o saco dele, beber perde a graça!

No caso do amor materno, a extravasão dessa afetividade neurótica pode causar insegurança na criança. Quanto aos adultos, Capelatto só vai mais além ao ser questionado sobre o ciúme como forma de afetividade neurótica. Embora ele fale bastante sobre o ciúme na parte reservada à perguntas, o assunto fica meio no ar, e ele mesmo diz que o ciúme em suas várias formas teria que ser tema de outra palestra. Mais pra frente vou adiante sobre essa questão da extravasão da afetividade neurótica.

A característica principal da psicose é a dificuldade de estabelecer uma identidade própria. Muitos são os "amantes psicóticos", pois a característica dessa forma de amor é a idealização da pessoa amada a ponto de a presença dela se tornar insuportável. Primeira figura que me veio à mente: Álvares de Azevedo.

Já na psicopatia, o amor só ocorre na presença do outro. Na ausência da pessoa amada, acaba o amor. Esse é o amor na era da sobrecarga, era da "anarquia afetiva", como diz o próprio Capelatto. Típico da juventude, mas presente também na maturidade, esse amor de consumo é fruto da busca imediata por prazer, pois passamos a descrer no futuro. Muitos são os casos de pessoas que ficam com quem não gostam, quase desprezam, deixando de lado a pessoa que realmente amam por não acreditar que ficarão juntos.

A busca psicopática pelo prazer faz reinar no mundo uma "anarquia afetiva", onde não há limites, tão pouco lei. Há somente a "obrigação do prazer imediato" (na minha opinião, o prazer é, por depender do outro, mediato. Mas esse é outro assunto).

Sem limites e sem afetividade, o amor na era da sobrecarga é conseqüência de nossa indiferença e da nossa descrença. A possível solução é reavivarmos o amor cuidador. É preciso sacrifícios para existir o amor.

Essas são as idéias principais da palestra, com pequenas observações minhas. Agora é hora de divagar!!!



Extravasão da Afetividade Neurótica


Como disse anteriormente, Capelatto fala pouco da extravasão da afetividade neurótica. Como sou curioso e intrometido, me embrenho nessa selva citando Freud:

"Normalmente, não há nada de que possamos estar mais certos do que do sentimento de nosso eu, do nosso próprio ego.
(...)
Há somente um estado (...) em que ele não se apresenta assim. No auge do sentimento de amor, a fronteira entre ego e objeto ameaça desaparecer. Contra todas as provas de seus sentidos, um homem que se ache enamorado declara que 'eu' e 'tu' são um só, e está preparado para se conduzir como se isso constituísse um fato."

(em "O Mal Estar na Civilização")


Afetividade neurótica é, como disse citando Capelatto, a vontade de cuidar do outro, amando nele o que há de igual e diferente de nós mesmos. O início da extravasão da afetividade neurótica se dá nessa confusão entre 'eu' e 'tu'. Para cuidar do outro precisamos nós mesmos estar seguros, ainda que isso exija sacrifícios.

Ao contrário do amor psicótico, que não admite a presença do ser amado, e do amor psicopático, que só existe na presença do ser amado, a afetividade neurótica extravasada se dá na ausência e na presença do outro. Na busca contínua de cuidar, nos confudimos com o outro, e transplantamos para ele nossos problemas. Tanto fazemos nossos os problemas do outro, como vice-versa. Cuidar do outro não é sê-lo, embora isso pareça romântico ("sou eu mais porque sou você", como na letra do Caetano). Assim como o excesso dessa afetividade entre mãe e filho gera insegurança, no amor-paixão (ou seja lá o que for), em vez de gerar insegurança, afastamos o outro.

O ciúme é mais exemplo de psicose que de neurose. Ainda que não suportemos a idéia da presença ao idealizarmos demais a pessoa amada, mantemos a idéia de posse, e a hipótese de ela estar com outro é a extravasão da psicose, não da neurose afetiva.


Ufa! cansei. Muita palavras pra um texto só!!!

Ressaltando que as opiniões aqui expostas têm embasamento somente em leituras aleatórias, nada aprofundadas. Embora seja fascinado por psicologia, não li muita coisa. Mesmo na parte em que escrevi sobre a palestra pode haver discrepâncias causadas por minha ignorância. Pretendo escrever sobre Closer - Perto Demais, baseado nessas idéias de neurose, psicose e psicopatia.

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