07 abril 2006

A Face Egoísta do Amor

O engraçado do amor é a relação que nossa própria felicidade tem com a felicidade do outro.
É uma tortura ver quem a gente ama triste. É como se fossemos nós mesmos a sofrer, e na verdade uma das faces do amor é essa: compaixão, do latim compassìo, “sofrimento comum”. Em “A Insustentável Leveza do Ser”, Milan Kundera divaga sobre a diferença dessa palavra em outros idiomas, afirmando que nas línguas de origem latina a palavra vem de passio, paixão, cujo significado é sofrimento; já noutras línguas (não lembro quais), a palavra é sentimento. Seria algo como co-sentimento. Lógico que toda essa idéia depende do tradutor, posto que Kundera nasceu em Praga, capital da República Tcheca, e eu nem sei qual idioma se fala lá.
Uma palavra equivalente à co-sentimento seria empatia, do grego páthé que também tem vínculos com dor e sentimento em sua origem etimológica (vou dizendo logo que não sei nada disso de cabeça. Vou lembrando das palavras e procurando dicionário). Mas amor mesmo é você compartilhar não somente a dor do outro, mas todos os seus sentimentos de alegria, tristeza, euforia etc.
Porém, dependendo da relação que você tem com a pessoa que ama, a possibilidade de felicidade dela te trás sentimentos confusos. Lógico que acima de tudo queremos ver a outra pessoa feliz, mas também queremos que nós, somente nós, sejamos a fonte de felicidade dela. Sempre que amamos alguém triste, sejamos nós também extremamente tristes, é por querermos torná-la feliz e também nos tornarmos felizes. Amar alguém é amar seus defeitos, mas a tristeza não é um defeito de fábrica (eu não nasci triste), é uma condição que pode durar toda uma vida, mas acaba de repente diante da pessoa amada. E em alguns momentos parece que só pode acabar assim.
Essa é a face egoísta do amor: a pretensão de monopolizar os motivos de felicidade do outro, que nos deixa perdidos, embora também felizes, quando vemos a pessoa que amamos feliz por motivos alheios a nós.
Nas mulheres isso deve dar um rebuliço desgraçado, pois já desperta logo o ciúme baseado na hipótese de o motivo da felicidade ser outra mulher. Em nós homens não. Parece que podemos de repente, não mais que de repente, ser abandonados.

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