14 outubro 2005

Trecho de uma carta que fará um ano no mês que vem. Lembranças de um tempo que, de certa forma, eu sofria, mas acreditava em algo. Não que eu sinta saudades desse tempo. Não?
São as únicas coisas que eu escrevi que poderiam virar um livro. Algo como "Os Sofrimentos do Jovem Werther", do Goethe. Tantas cartas, tantas idéias, todo sentimento... e eu me pergunto: Valeu a pena? Muitos dirão, citando Pessoa: tudo vale a pena se alma não é pequena... blábláblá. Talvez, quando amamos demais, a alma se torne pequena diante da imensidão do coração. Por isso não vale a pena.
É uma pena...


Inicialmente, isso pode parecer somente um ato covarde. Alguém fugindo de um problema.
Acontece que como eu tenho mania de tentar atribui fórmulas pré-definidas, e quase matemáticas a tudo o que acontece ao redor, poderia divagar sobre a relação fraqueza / covardia.
O problema maior é que eu sou assim mesmo. Minha mania de divagar sobre a vida, de pensar demais, de querer entender, explicar, argumentar, abstrair... Eu sou assim, mas posso mudar. Portanto entenda como quiser essa atitude.

(...)
Eu preciso de um tempo pra pensar. Deixar de lado o 'querer aparecer', estar sempre à vista de todos, compartilhar minhas dores com pessoas erradas, dizer coisas pra chocar os outros. O gesto de estarmos juntos, mesmo eu gostando de você de outra forma, é exatamente aquela metáfora de se esconder do fogo. A gente se esconde da chuva, mas do fogo não. Não se deve permanecer dentro de uma casa em chamas. Se começou a pegar fogo, a única opção é sair; não adianta tentar salvar algumas coisas, e se expor ao fogo.
Então surge a sensação de asfixia, manifestada nalgumas cartas mais confusas como as três últimas que mandei pra você. Podemos não morrer queimados, mas por asfixia causada pela fumaça (no meu caso essa fumaça são as coisas que deixo de dizer).
"o instinto: quando a casa está pegando fogo, esquecemo-nos até do almoço. Mas depois comemo-lo sobre as cinzas" Nietzsche.

O amor é uma contraposição aos instintos. É irracional. A primeira manifestação dessa contraposição aos instintos vem do fato de no início, negarmos o puro 'desejo sexual' embutido no amor. A pessoa amada é intocável. Conversamos sobre isso uma vez, quando eu disse que não era mais um menininho 'querendo te comer', e disse a verdade quando afirmei nunca, até então, ter nos imaginado transando, ou qualquer coisa do gênero. Isso também pode ser ilustrado pelo choque do Dorian quando Lorde Henry perguntou se ele já tinha 'ficado' com a Sybil, e Dorian manifestou horror dessa possibilidade. Lord Henry, como de praxe, fez um discurso muito similar a esse que fiz. Nalguns dos contos de Noite na Taverna do Álvares de Azevedo também têm exemplos disso, e é de se destacar também que nunca vimos Werther, do Goethe, falar em sexo nas suas cartas.
Mas isso aqui não é uma tese de psicologia. Não preciso provar nada pra você.

(...)
Ontem você perguntou se deveria responder aquela carta... não sei... acaba sendo um pouco de perda de tempo. Você vai dizer as coisas de forma bem surreal, e toda ela (como boa parte das coisas que você diz ou escreve sobre mim) poderia ser resumida em algumas palavras "desculpe, mas eu não me importo."
E eu te desculpo, sempre. A culpa não é sua, tenho certeza. Tudo, desde o começo ficou claro. Eu até posso interpretar algumas coisas de forma errada, posso ficar agora com peso na consciência imaginando que o caminho correto poderia ser esperar, e quem sabe um dia a coisa fluiria. Mas eu vou esperar, só que não da forma de antes.

(...)
Eu deveria. Mas o resumo da ópera seria bem simples: eu gosto de você de todas as formas possíveis (amiga, mulher, companheira, e as variáveis amorosas, morais, espirituais, intelectuais), e não me satisfaço com nada que não seja o máximo. Confesso ter te enganado. Não sou puramente seu amigo sincero. Eu te amo. Te quero. Te apaixono (sic). Te invejo. Te admiro. Te adoro... tudo.

Mas preciso respirar. '"Deixe-me ir, preciso andar, vou por aí a procurar rir pra não chorar. Se alguém por mim perguntar diga que eu só vou voltar quando me encontrar"

Outra coisa a deixar clara é que essa carta não é nenhuma manifestação de inimizade, ou de hostilidade. Podes sempre contar comigo, pro que der e vier. Nos esbarraremos por aí, e vez ou outra nos daremos sinais de vida. Aliás, ano que vem estudaremos na mesma faculdade... Só estou um pouco confuso, e 'asfixiado'. Preciso de solidão de verdade, e não somente ausência de 'pertencer' a algo. Preciso me fechar pra balanço.

beijos, rosas, um pouquinho de lágrimas, alguns suspiros.

do sempre (s)eu

fabricio

1 comentário:

Anónimo disse...

Nossa!
è a única coisa que consigo dizer após ler ....