05 março 2006

Crônica de Um Desespero

E eu abri os braços, fechei os olhos, dancei e chorei. Não lembro quais músicas, não lembro quem estava ao meu redor. Mas deveria haver barulho sim. Mas eu era silêncio. Silêncio e lágrimas.
E antes disso eu havia bebido muito e desesperadamente. Como já tenho precedentes de loucuras etílicas, deixei as lágrimas sob o álibi do álcool. Ninguém precisa saber. Um pouco antes eu ainda tentei buscar nas mãos de uma paixão antiga, mas pouco significativa ante aos fatos recentes de meu amor indelével, um meio de não cair nesse buraco de lama em que eu sabia que ia cair. Ela me ignorou, e eu caí sozinho. Mas isso era normal... sempre foi assim, e eu nem liguei. Se fosse um outro dia, talvez eu devesse falar pra ela dessa minha paixão discreta que me assola há tempos. Mas ali não fazia sentido... não quando eu estava com umas 10 baratas kafkianas no meu estômago, junto com aquele personagem de “A Construção” cavando com os dentes trilhas dentro de mim.
Puta que pariu, como doía.

Braços abertos, mexer frenético de pernas e mãos e cabeça. Boca aberta de alguém que estivesse prestes a gritar. Mas eram suspiros. Lágrimas... Meu pescoço estava molhado de lágrimas... de onde vinham tantas lágrimas?
Eu deveria ter ido embora. Mas resolvi fazer uma força sobre-humana pra brilhar. E devo ter brilhado.Teve um momento, ainda no bar, em que eu pensei que ia sair correndo. Deveria ter corrido e sumido por muito tempo. Me imagino correndo e gritando como os personagens das peças “Teatro Noturno” que escrevo, se equilibrando no muro da av. Washington Luiz, como já fiz outras vezes. Mas não... ninguém merecia compartilhar comigo aquela dor. Saindo do bar, antes de ir pra ‘balada’, desabou uma pequena tempestade, mas ninguém soube: eram minhas lágrimas que caíam do céu.
Levantar brusco das cadeiras. Ir ao banheiro. Pedir a conta. Digitar a senha. No carro, ainda cantamos. Fazia sentido cantar.
Acho que depois que saí do carro, quase não falei. Dancei, bebi, e depois... chorei. Já sabe. Eu deveria ter abraçado minha paixão discreta e chorado nos ombros dela (lembro da minha mão na cintura dela, mas ela fugiu). Talvez aliviasse muita coisa. Mas ela não sabia de nada, nem de minha paixão discreta por ela (com certeza esse não era bom momento para esse tipo de comunicado), nem dos motivos das lágrimas. Acho que ela ia se assustar. Foi a partir daí que eu fechei os olhos. E na escuridão dos olhos fechados só havia meu amor indelével. Daí as lágrimas.
Quando me senti um foguete caído (melhor ser um foguete caído do que não ter nenhuma explosão de luz, Wilde), fui embora sem me despedir. Havia filas ainda, e na fila ainda tinha lágrimas saindo dos meus olhos. E as pessoas tão felizes, entre abraços e beijinhos e carinhos sem ter fim, não entendiam nada! A cara das pessoas era engraçada, tenho que confessar. Sim, é de se destacar: era uma balada GLS. Quem me arrastou foram minhas amigas, e eu nunca entraria num lugar assim em dias normais. Mas ninguém me enchia o saco e eu não estava nem aí. Eu, que de gay só tenho as lágrimas fáceis e uma sensibilidade acentuada, estava dançando e chorando numa balada GLS por uma menina que tinha um problema ainda maior que meu maior-amor. Mas independente do que acontecesse, eu ficaria com ela o resto da vida em nossa dulcíssima prisão. Ela sabe, mas não entende. E eu também rasparia a cabeça, pode ter certeza. E a faria sentir-se a mais linda das pessoas, pois ela realmente era. É.
Mas não vai acontecer nada, tenho certeza. Eu choro por que sou um idiota. E talvez nem fiquemos juntos, idiotas que somos.

Ao chegar na rua, já era dia e eu não sabia onde estava. Peguei um táxi e dentro do táxi ainda havia lágrimas escorrendo dos meus olhos. Motorista perplexo. Todos estavam.
Em casa, a fúria. O que era delicadamente escorrido pelos olhos, virou uma ira inexplicável, vinda junto com as lembranças dos compromissos do dia que começava, que dali algumas horas viraria um insistente tocar e vibrar do celular. Sim, o celular. Olhei pro celular como quem olha pro próprio algoz e o atirei na parede. Fiquei feliz por alguns instantes. Como só se fizeram 3 ou 4 pedaços do celular, peguei a parte maior e atirei de novo. Foi legal... Vários pedaços.
Dormi.
Acordei com os olhos inchados. Tomei um banho, me troquei e peguei os estratégicos óculos escuros lembrando de uma música do Mautner, que me foi apresentada por Caetano: “eu uso óculos escuros pras minhas lágrimas esconder”. Ah... e no metrô a mesma perplexidade coletiva. Tanto faz... tanto faz...
Nos falamos ao telefone e eu não tinha forças pra dizer: “calma...”. Era ela quem dizia pra mim. Lembrei da mensagem que me deu a notícia e terminava com um “eu também te amo”. Eu chorava, ela percebeu. E eu, sempre cheio de palavras, não tinha o que dizer.
A pessoa feitinha pra mim, musa-mor dos meus textos mais bonitinhos... Palavras estranhas: nódulo... hipófise... 7 mm. Contexto de poema do Augusto dos Anjos.
Pesquisando na internet, vi que isso não gera lá grandes problemas. Tem até comunidade no orkut.
Mas eu continuo querendo fugir. Agora mais do que nunca. E não vou comprar outro celular nem tão cedo. Estou de férias. Eu morri um pouco ontem...

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