Há um abismo enorme entre o que sinto e o que consigo escrever sobre o que sinto. Aliás, há outro abismo maior ainda entre o que falo e o que sinto.Por mais que busque resposta em filósofos e psicólogos complicados, muitas vezes me vejo em versos simples de poetas sem frescura, como Leminski:
um homem com uma dor
é muito mais elegante
caminha assim de lado
como se chegando atrasado
andasse mais adiante
carrega o peso da dor
como se portasse medalhas
uma coroa um milhão de dólares
ou coisa que os valha
ópios édens analgésicos
não me toquem nessa dor
ela é tudo que me sobra
sofrer, vai ser minha última obra
(citava esse poema de cabeça muito antes da Zélia Duncan musicá-lo)
Não há verdade dentro de mim que não tenha sido beijada, em algum momento, pela boca da poesia, da arte, da vida, da revolta (aqui, todos sinônimos). Certa tristeza minha tem origem nesses mistérios, nessa mesma poesia que muitas vezes trás felicidade. É muito difícil entender.
O Amor, por exemplo. É tão simples nos filmes e livros, mesmo quando não tem final feliz. Na minha vida é um monstro debaixo da cama! É incrível como a proximidade de qualquer sentimento nos faz enfiar a cabeça no travesseiro e se cobrir. E se resolvemos dar uma olhada é pior ainda, pois pode haver somente pó debaixo da cama.
Os romances acabam na última página; então é só voltar interpretando tudo intelectualmente, concluindo, no máximo, ao ler a boigrafia do autor. E eu? Não há última página. Posso sempre escrever mais, e mais, e mais, e mais, e mais, e mais, e mais...
Sem comentários:
Enviar um comentário