12 abril 2012

Na arquibancada


Deitado na arquibancada da quadra da faculdade, ouvindo Vinicius de Moraes num fone de ouvido que praticamente me isola do mundo, comecei a pensar no porquê de nunca mais ter voltado a escrever, e mesmo de ter passado a me isolar do mundo - seja através do fone ou de meu silêncio e indiferença com quase tudo ao meu redor.
Isso me veio à mente por que no show que estava ouvindo, Vinicius lê uma carta que escreveu para,

"Tomzinho querido,

Estou aqui num quarto de hotel que dá para uma praça, que dá para toda solidão do mundo. São 10 horas da noite e não se vê vivalma. Meu navio só sai amanhã a tarde, e é impossível alguém estar mais triste do que eu. E como sempre, nessas horas, escrevo para você cartas que nunca mando."

(Neste ponto geralmente eu refletiria sobre a solidão, citaria logo de cara o Nelson Gonçalves e sua idéia de solidão acompanhada. Mas ainda não é momento.)

Logo depois que ouvi o Vinicius, pensei em retomar meu antigo hábito escrevendo cartas; a primeira sem dúvida seria para o próprio Vinicius. Com certa pieguice, iria escrever que sentia saudades dele; saudades do tempo em que, aberta uma garrafa de whisky, logo eu dizia "o whisky é o melhor amigo do homem; é o cachorro engarrafado!" e brindava em sua homenagem (ao Vinicius, não ao cachorro - tinha esquecido o quanto esse negócio de seu e sua é o terror de quem escreve). Citaria dezenas de episódios hilários em que bebi em sua companhia, como quando cheguei sozinho ao "Bar do Tinóia" para tomar um chope após um dia fatídico, e o próprio Tinóia me chamou dizendo "hoje você não pode ir embora. Hoje tem uma homenagem ao Vinicius de Moraes" - todos sabiam o quanto eu gostava de Vinicius. Então fiquei, pedi minha garrafa de whisky (naquela época eu tinha algumas espalhadas por bares de Moema), e não lembro como voltei para casa. Sério mesmo. Acordei em casa, com vômito espalhado por todo canto. Dias depois quando voltei ao bar com alguns amigos, a garçonete me cumprimentou rindo: "oi chorão", e então descobri que não só tomei um porre homérico, mas cantei todas as músicas e recitei todos os poemas aos prantos. Lágrimas escorriam até o pescoço. Eu era muito sentimental.

Porém, por mais que eu goste de Vinicius, escrever uma carta para alguém morto que nunca conheci de verdade (?) não é exatamente uma boa forma de refletir sobre meu isolamento. Então simplesmente comecei a escrever. E cá estou, ainda com o fone e ainda na arquibancada, mas agora sentado. Escrevendo.


Quem tem ou algum dia teve o hábito de escrever deve ter percebido que nunca se sabe ao certo para quem ou para que escrevemos. "Ninguém escreve por que é feliz" alguém que não me lembro escreveu um dia - e no fundo ninguém é feliz. Não o tempo todo, não enquanto reflete sobre a vida e o mundo ao seu redor. E escrever é refletir.

Eu pretendo voltar a escrever. Necessito.
Mas infelizmente agora preciso tenho que ir para uma aula de Cálculo Vetorial e Geometria Analítica.

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